domingo, 29 de dezembro de 2013 @ 16:56
Ah, o verão... Que época mais (obviamente) quente, feliz,
literalmente calorosa, cheia de gente alegre indo à praia, tomando sorvete e o
momento de levar um tapa na cara da realidade.
Semana passada quase fui intimada a pagar a carteirinha do
clube perto de casa, e tudo o que é desculpa aparece quando isso me acontece.
“Ah, acordei tarde” “É muito cheio” “Não gosto da piscina de lá” “Mas eu vou
sozinha? Não mesmo”, coisas assim, tudo pra maquiar o que eu não queria dizer
para o meu pai: “EU NÃO VOU CURTIR O VERÃO, É OBVIO, PORQUE EU TÔ GORDA”, mas
depois que eu disse isso a ele, caiu a minha ficha.
Ainda nem fiz dezesseis anos e, desde que me lembro, estou
cheia de neuras, desde a minha vizinha com “nossa, você ta cheinha” ou as
minhas amigas da infância com o inesquecível “bea, desiste que você nunca vai emagrecer,
você é gordinha mesmo” me atormentando. E assim, eu percebi que a partir do
momento em que aparência começou a ser um fator determinante desse período,
(ah, a adolescência!) eu nunca me aceitei, nunca.
Lembro de ter uns oito ou nove anos, ficava me olhando na
frente no espelho a cada refeição pra ver se a minha barriga tinha sumido, mas
era barriguinha de criança, eu não entendia, e me achava E N O R M E. A partir
daí foi só piorando.
Aos doze comecei as aulas de ballet, mas as meninas da sala
eram tão magrinhas, tão bailarinas, e eu era a gorda (pensava) que chegava em
casa e chorava porque as amigas riam de mim por isso. Com treze, eu passei a
inventar um monte de desculpas pra não sair de casa e me isolei com um caderno,
onde eu anotava o que sentia, as músicas que ouvia, tudo. Esses dias eu parei
pra ler esse tal caderno e foi preocupante, o meu ódio próprio já tinha sido semeado.
Frases do tipo “Por que eu não sou bonita?”, “A pessoa mais repugnante do
mundo”, “Não há nada em mim que tenha valor” ou então “Ninguém vai me amar se
eu for gorda” (com um “Isso é tão hipócrita da minha parte” ao lado, ainda bem,
eu não era assim tão tola) pularam do caderno, ao lado de desenhos distorcidos
de mim, e agora eu vejo como aquilo era só a ponta do iceberg.
Com quatorze anos eu vivi um inferno. E com esse inferno
vieram episódios terríveis de automutilação, compensação e automedicação. Como se
não fosse o bastante, meu coração estava partido e tudo ia de mal a pior.
Lembro de me olhar no espelho e sentir tanta vergonha do que via, que acabava
descontando em mim, no meu corpo, mas nada disso adiantou muito. Nessa época eu
emagreci uns 5 kgs, e você pode perder todo o peso do mundo, mas nunca vai ser
o suficiente se estiver doente. Passava dias em jejum, chorando na hora de
dormir, me odiando tanto a ponto de desejar morrer e me machucando. Até que eu
finalmente caí em consciência e percebi que nada daquilo estava me ajudando, e
decidi parar.
Dessa fase, me restaram algumas cicatrizes e uma lição de
superação. É difícil ver o quanto se é bonita depois de tanto tempo com ideias
distorcidas de si mesma, mas eu persisto, e o que disse ao meu pai foi o passo
que precisava para perceber como eu achava que me aceitava, mas na verdade só
maquiava o que não gostava.
Então o verão veio, e a minha cabeça explodiu com aquele
sentimento de “preciso parar de comer”, mas eu estou tão saudável, e tão feliz
comigo que nem mesmo a barriguinha que vejo no espelho na hora de tomar banho
me incomoda tanto quanto antes. Tá, não é uma vida perfeita e às vezes ainda
tenho algumas neuras, mas a pior parte já se foi há tempos.
Ainda vejo as garotas da colégio, tão esbeltas, tão belas,
tão magras, e tão vazias. Vejo as fotos do tumblr, do lookbook e acho lindo as
meninas com os espacinhos no meio das pernas, mas isso não me afeta mais.
Porque eu pensava que só podia ser feliz se fosse magra, se as minhas estrias
desaparecessem e meu sorriso, meu cabelo, fossem como o das meninas da escola,
ainda bem que a gente cresce e amadurece, né?
E muita coisa aconteceu desde então. Cortei o cabelo, e ele
já cresceu tudo de novo, mudei as músicas do celular, amadureci, troquei as
amizades e me afastei de tanta gente que só me fazia mal e não me deixava ver
como eu realmente sou, percorro a cidade de metrô, finalmente saí da escola e
agora estudo no lugar mais legal do mundo (pra mim), onde conheci tanta gente
que gosta de mim do jeito que eu sou, e estou até me preparando pra correr uma
maratona.
E eu prometo não criar mais desculpas pra não ir à praia,
porque todo mundo tem as suas inseguranças, e se eu deixar isso me privar do
verão tão tropical e tão brasileiro que sorri pra mim, a única pessoa perdendo
serei eu, é por isso que estou finalmente me libertando dessa história que
ficou escondida em mim por tanto tempo, e deixando eu ser feliz nessa estação, e
estando plenamente ciente de que agora estou indo e fazendo tudo de um modo
saudável, sem deixar que o medo do que pensem (ou do que vejam) me afete. Por
que eu sou muito mais que aparência, eu sou muito mais que o meu jeans 40, sou
até mais que essas coisas superficiais que costumavam me atormentar, e acredite
você ou não, eu não sou gorda, mas o mundo me fez acreditar que eu era, e eu
acreditei, mas sigo dizendo pra quem estiver lendo que eu sou linda! E nada
mais vai fazer com que eu sinta o contrário.